Tomei a liberdade de dirigir-lhe esta carta esperando que a mesma receba da sua parte a melhor das atenções. Sou uma jovem alentejana, natural de Beja, profissional ligada às artes, mas não artista e escrevo-lhe para lhe apresentar a minha indignação. Na qualidade de produtora de uma suposta associação de actividades culturais denominada drAMA, encontro-me actualmente a formular a candidatura aos apoios financeiros directos, do tipo anual, do Ministério da Cultura.
Com efeito, é preciso preencher os respectivos formulários neles devendo constar dados como: a identificação completa da entidade que se candidata, a sua natureza juridica, a sede e zona onde exerce maioritariamente a sua actividade, um breve historial da entidade, notas biográficas acerca dos responsáveis pela direcção artística e pela gestão administrativa e financeira. Note-se que até aqui estão, para já, envolvidas, pelo menos, três pessoas.
De seguida, nos ditos formulários deve a associação dar conta do seu Plano de Actividades sendo que a drAMA associação se assume como uma estrutura de criação na área do teatro, as propostas que fazemos para um ano de actividade cinjem-se a 4 estreias o que equivale a dizer que temos três meses de preparação e exibição para cada uma (12/4=3). Subjacente a cada trabalho/actividade/peça devem estar descritos os objectivos artísticos e profissionais, as linhas de orientação e estratégias de desenvolvimento, o que considero muito salutar, pelo que somos convidados a dar também conta dos mesmos nos respectivos formulários do Ministério da Cultura ou o mesmo será dizer da Direcção Geral das Artes. Mas não só!
Fazer uma candidatura aos apoios directos do Ministério da Cultura obriga ainda a que indiquemos quais as actividades a desenvolver em território nacional e no estrangeiro, que indiquemos como e por quem são constituídas as equipas artísticas e técnicas, que explanemos acerca do público-alvo que visamos atingir e das iniciativas de captação e sensibilização de públicos que iremos desenvolver. Há ainda que desenvolver um plano de comunicação gizado para atingir tais objectivos.
E, num outro formulário não menos importante, devemos fazer toda a previsão orçamental do ano indicando estimativas orçamentais, tais como: os encargos com pessoal, espaço, equipamentos, produção, gestão, comunicação e outros e ainda receitas estimadas, tais como: receitas próprias, leia-se bilheteira, acordos de co-produção, patrocínios, mecenato e outros apoios e financiamentos.
Dá trabalho, senhor Presidente. Também dá gozo, é verdade, mas dá trabalho preencher tanta papelada para no final concluirmos que (e é para estes dados numéricos que chamo a sua atenção) para concluirmos que o Ministério da Cultura(MC) atribui, em 2010, apenas e só 85 mil euros às estruturas de criação. Faça as contas senhor Presidente. O Alentejo tem o distrito de Portalegre (15 concelhos), de Évora (14 concelhos) e de Beja (14 concelhos). Temos 43 concelhos. Se cada um deles tivesse uma estrutura de criação (que bem pode ser o caso), teríamos um apoio na ordem dos 11% já que o MC apenas apoia 5 estruturas.
Estas tanto poderão ser da área das artes plásticas e fotografia, como de cruzamentos disciplinares, como de dança, música ou teatro. O que me leva a concluir que o teatro pode nem sequer ser contemplado no final da avaliação do MC.
Repare: o Alentejo é a única região cujos apoios têm 2 digitos (85 000), o Algarve (com apenas1 distrito/Faro) poderá ser apoiado com 108 000, o Centro com 375 000, Lisboa e Vale do Tejo com 485 000 e o Norte com 575 000.
Ora se fizermos as contas e dividirmos os 85 000 do Alentejo pelas cinco candidaturas a apoiar facilmente concluímos que a cada uma respeitára apenas 17 000 euros. Falemos de moeda antiga para isto soar mais real: 17 000 euros são, nada mais, nada menos, que 3400 contos.
Ora bem! Uma estrutura como a drAMA tem um director artístico que é ao mesmo tempo responsável financeiro, encenador e actor, uma produtora que é ao mesmo tempo cenógrafa e figurinista, duas actrizes, um técnico de som e um técnico de luz. Contabilizámos 6 pessoas. Se cada um ganhar 1000 euros, à excepção dos técnicos que são contratados à hora, tínhamos ao final do ano 48 000 euros. Isto, está claro, a recibos verdes. Sem segurança social, sem irs, sem subsídio de alimentação, sem seguro de saúde.
Depois há muitas mais contas a fazer (deslocações, cenários, adereços, consumiveis, cartazes, etecetera, etecetera), mas pensemos apenas na renda. Alugamos um espaço por 500 euros mensais o que perfaz, no final de cada ano, a módica quantia de 6 000 euros.
Ora veja só a importância que a Autarquia que dirige assume neste panorama. A sua e as restantes do distrito. Se não for o poder autárquico a apoiar as estruturas de criação, nomeadamente através de subsídios e da cedência de espaços como poderemso subsistir? Com mecenato? De quem? Do LACameirinha? Da EDAB? Da EDIA? As grandes empresas do concelho? Com a bilheteira dos espectáculos? Com a itinerância?
O MC não cumpre a sua tarefa de descentralização da oferta cultural. O MC não cumpre com a sua função de corrector de assimetrias regionais. O MC não concorre para a consolidação das entidades e actividades de criação.
Estruturas como drAMA criam postos de trabalho, oferecem serviços educativos, promovem estratégias de sensibilização de públicos, são instrumentos de desenvolvimento económico e de qualificação e, ainda, de inclusão e coesão sociais.
Por tudo o acima exposto, senhor Presidente vou colocar-me ao lado dos protestos que terão lugar no próximo dia 27, em Moura, e que reunem 3 estruturas da região: os grupos de teatro "3 em Pipa", de Odemira; "Teatro Fórum", de Moura e "Lêndias d' Encantar", de Beja".
Contamos com o seu apoio para a prossecução dos nossos objectivos, a bem da cidade de Beja, do concelho e da região.
Assinado,
drAMA (real)
13 comentários:
Apoio a vossa posição,embora me pareça que ao poder pouco interessa mentes abertas e espíritos critícos.
A carneirada de seguidistas, pantufeiros e lambe botas sempre foram as suas preferências.
Camolas - Trata-se apenas de fazer teatro. Trata-se de cultura.
Não gosto de entrar sem bater , mas fui atrevida e entrei!
Gostava de ajudar....mas não sei como!
Moça, ontem deixei aqui um comentário, mas isto pelos vistos não gravou. Gostei muito desta Carta Aberta e tomei a liberdade de te copiar na íntegra. Tens lá no meu pasquim a carta com a merecida referência e com toda a deferência, obviamente... Belíssimo!
ola fêmea
gosto muito deste teu texto, muito rigoroso nos números e muito lúcido na analise. Mas sabes, é tão lúcido que me deixa triste, pensar que nenhum autarca deste alto e baixo Alentejo, reagiu a esta "injustiça e descriminação", segundo as palavras da ministra da tutela. Para que servem aqueles que elegemos.
Desculpa a ignorância: a Ama é?
Onde posso encontrar mais informação sobre a dRAMA?
Raquel - Ainda bem que entrou. Obrigada pela disponibilidade. Quer mesmo ajudar? Vá à conferência de imprensa no próximo dia 27. Não deve estar aberta apenas aos jornalistas e juntos parecemos muitos.
Chéri - Obrigada. Fi-la mesmo com gosto. Andei, andei que tempos a pensar como abordar a questão e decidi colocá-la assim.
olá macho!
Obrigada. Não reagiram, mas vão reagir! À maneira deles terão que apoiar as estruturas de criação. E sabem-no e, aliás, são os principais interessados em fazê-lo. Da fatia que recebem do Orçamento de Estado consta também uma maquia para a CULTURA, não é? Eu acredito que os apoios vão surgir.
H - Bem se vê que és um homem ocupadissimo e les os textos na diagonal. drAMa é "uma suposta associação de actividades culturais" que possui um grupo de teatro com o mesmo nome e a carta aberta foi a forma que encontrei de manifestar a minha opinião sobre a atribuição de subsídios anuais aos agentes culturais do País e do Alentejo apelando ao bom-senso e às obrigações dos autarcas. Compreendeu?
Teatro Fórum de Moura - A drAMA não existe na realidade. Leia os outros comentários. Reivindiquem tudo amanhã.
H burro!!
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